"A buzina dos Outros nunca me incomodou"
É Conceição, 70 anos de idade, quem o diz.
Oriunda da freguesia de Moldes, Conceição Martins Gomes foi a primeira mulher taxista do concelho de Arouca.
Nascida a 20 de dezembro de 1948, a taxista é casada há 52 anos, com Manuel.
Decidiu começar a conduzir, numa época em que poucas mulheres o faziam. Tirou a carta de pesados por 11 contos, embora nunca tenha conduzido um veículo pesado, à exceção do dia do exame. O principal objetivo que a levou a tirar a carta de condução foi ter viatura para se deslocar com os filhos quando fosse preciso, sem estar dependente do marido, também taxista. A vida fez com que também ela fosse taxista.
Conceição lembra que nunca se sentiu discriminada por ser mulher, contudo afirma que eram as mulheres, por não estarem habituadas a ver outras mulheres a conduzir, quem mais desconfiava da sua condução. Recorda um dia em que ofereceu boleia a uma senhora e esta, com medo, recusou-se a entrar no seu carro e foi a pé.
Mais tarde, com o avançar dos anos, as pessoas ligavam para sua casa e diziam que queriam que fosse Conceição a levá-los, pois a taxista, auxiliava as pessoas dentro do hospital, acompanhando-as às consultas.
Numa vida profissional intensa - 40 anos, muitas foram as peripécias pelas quais passou, embora lembre que nunca teve nenhum acidente.
Dos invernos mais rigorosos recorda as vezes em quem ficou presa, ora pela neve, ora pela lama, numa Arouca, cujas estradas eram ainda em terra batida. Ficou presa quando fazia o serviço de transporte das crianças de Regoufe para a Ponte de Telhe, onde estas vinham apanhar o autocarro para o "liceu".
Um dia, num dos primeiros enquanto taxista, a descer a estrada das Costeiras junto ao estádio Afonso Pinto Magalhães, ficou sem travões. Aí, valeram-lhe as aulas de condução de pesados, onde aprendeu a travar de outra forma, em segurança. Nesse dia trazia um casal e os dois filhos que sem se aperceberem do sucedido chegaram ao destino sem qualquer problema. Só alguns anos mais tarde souberam desse "segredo", guardado por Conceição.
Certo dia, num dos muitos desde 1979, um senhor desmaiou no seu carro, quando Conceição o transportava para a hemodialise. A taxista ligou os quatro piscas para que a deixassem passar. Quando chegou ao hospital carregou o senhor "às costas", enquanto esperavam por uma cadeira para o transportar.
A conduzir, Conceição mostra-se sempre calma pelo que conta que um dia na Rotunda da Boavista, no Porto, os carros buzinavam, numa impaciência típica das grandes cidades. Contudo, a taxista manteve-se serena, pois a buzina dos outros nunca a incomodou.
A taxista reconhece que um dos segredos do sucesso da sua profissão passa por respeitar sempre os clientes, os seus silêncios, a sua necessidade de falar e o seu espaço.
Assume-se como uma mulher decidida, que sabe o que quer. Embora reconheça que hoje à menos serviço, fruto das pessoas terem carro e os serviços que outrora eram solicitados aos taxistas, como o transporte dos doentes, agora já não serem, afirma que o tempo saberá quando é que ela pousará a chave. O seu marido reformou-se em abril de 2019 e agora é apenas ela quem "tira o carro da garagem".
